domingo, 2 de dezembro de 2012

A Procura



Estava correndo e sentia ser perseguido. Minha visão parecia cobrir-se por um líquido qualquer. Mais adiante, achei um espelho, que estava um pouco quebrado. Para chegar ao artefato, tive que andar sobre cacos de vidros, machucando meus pés. Peguei o que sobrava do espelho. O líquido espesso escorria pelo meu rosto. No reflexo da minha imagem, notei que havia um projétil preso em minha testa. Era isso! Fui alvejado e nem me dera conta, talvez por causa da ânsia pela fuga.

Continuei andando. Tentei extrair aquele corpo estranho de minha cabeça. Desmaiei. Algum tempo depois, acordei. Instintivamente, continuei correndo. Eu ouvia vozes, que não paravam de me perturbar. Com visão turva, pude divisar, a uns vinte passos dali, uma maleta escura. Abri-a. Dentro dela havia documentos de um tal de Elliot e um velho revólver, carregado com três balas e com capacidade para mais três. Guardei os pertences comigo. Continuei a minha trajetória.

No caminho recolhi folhas de bananeiras, madeira e cipós. Quando chegou a noite, acendi uma fogueira. Afiei uma pedra, fiz com ela uma lança e fui caçar. 
Deparei-me com uma onça. Parecia dormir profundamente. Tentei cortar-lhe a cabeça. Entretanto, o animal rolou e dei de cara com seus olhos arregalados sobre mim. Dei um salto para trás e percebi que havia um furo no canto esquerdo de sua boca. Estava morta! Retirei a região que a bala havia acertado e, comparando a espessura e peso, confirmei que era igual as balas que eu encontrara no revólver. Peguei algumas partes da carcaça do animal e voltei ao acampamento.

Preparei alguns nacos daquela carne e assei-os para matar a fome daquele dia. Fui rever os documentos e dessa vez recordei-me daquele nome. Era o meu! Mas como não reconheceria meu próprio nome?! Estava confuso. Fiz um abrigo. O teto de folhas de bananeira, paredes de madeira, cipós para amarrar tudo e algumas folhas que sobraram para deitar-me e dormir. Comi a carne assada e cai no sono, com muito sangue escorrendo.

No dia seguinte, o ferimento da minha testa tinha desaparecido. Saindo do abrigo, espantei-me. Haviam esqueletos humanos espalhados por todo acampamento. Alguns minutos depois, o chão rompeu-se e tudo começou a ser sugado para dentro do solo. Peguei a arma e tentei fugir; não tive tempo. Chegando ao que parecia o "Mundo dos Mortos", muitos esqueletos se levantaram e reuniram-se em volta de mim, dizendo:

-Aqui tem o que você procura. - Saquei a arma, porém, não tiveram medo. Afinal já estavam mortos!

-Você acha que nos destruindo irá salvar-se e reencontrar sua mãe, Elliot? - 
Como sabiam meu nome? Conheciam-me e já estavam mortos! De repente, lembrei: aquelas vozes eram da minha família. Mas, como eu fui parar naquele lugar horroroso se ainda estava vivo?!

-Não, você está morto, filho. - Mãe! - exclamei, surpreso - Mas, como?! Como eu morri?! - O acidente na floresta, não se lembra? Você estava paralisado, na frente da onça, quando um caçador inescrupuloso atirou. Matou os dois, com uma bala em cada um. Bem, não tem mais por que fugir. Vamos embora. Nosso lugar é outro, agora! 


quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Como Fazer um Conto!



Hoje vou contar como se faz um conto. Só para a sua informação, leitor, eu sei sobre contos tanto quanto você sabe sobre etrusco. O meu editor me contou que eu tinha que escrever sobre contos, então iniciei uma crônica para contar o quanto eu sei sobre os contos. Afinal, eu escrevo crônicas, e se o senhor leitor não conhecer contos, talvez acredite nas bobagens que vou contar agora. Bem, vamos lá!

O fator principal de um conto é a "perfumaria". Sim, senhor, o conto é nada mais nada menos que uma fábrica de "encheção de linguiças". Nos tempos de escola, o professor de redação vai tentar mostrar que o conto é felicidade, criatividade e descrição (sinônimo de "encher linguiça") e vai te dar mil planilhas de preenchimento sobre caracterização de personagens, de espaço, tempo e coisas mais bobas que essa  crônica, e se você leu o texto até aqui, você não deve estar em seu juízo normal.


Depois de alguns meses preenchendo as planilhas, você (se estiver fazendo redações escolares ainda) já terá repetido de ano, pois não entregara nenhuma redação após aquela praga chamada conto, que você ainda está escrevendo. Porém, continuando, agora você escolherá o tema, e depois pensar em outro que seja realmente bom, pois o conto, além de ser trabalhoso, é insatisfeito também, isto é, ele não aceitará um tema abaixo de seu nível cultural.

Agora que você já tem seu tema e já foi expulso da escola por conta de repetir três em redação, há um pouco mais de tempo e calma para você trabalhar direito e voltar às aulas numa escola pública, pois as particulares não vão te querer mais. Faça o início, depois o fim, pois assim você terá um bom desfecho para o  seu conto e não encherá mais linguiça ainda! Ah! E não faça um conto muito longo, pois não sabemos até que parte do texto o seu futuro professor de redação lerá...

Agora você já sabe porque eu escrevo crônicas!!!

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Nada é por Acaso


Muitos gênios da música possuem métodos e técnicas. Muitas vezes peculiares. Fico imaginando como esses hábitos surgem. Talvez uma simples fala ou ato, em um momento instantâneo da vida deles. Bem, como surgiram alguns eu não sei; mas, posso afirmar que uma dessas técnicas bastante peculiares na música eu sei muito bem como surgiu. Pois eu tive participação direta no caso, embora muitos suspeitem da sua verdade.
Há uns tempos, eu estava muito fascinado pelas grandes invenções. Pesquisei muito sobre os grandes inventores e suas invenções, como a lâmpada de Thomas Edison, a pipa de Benjamin Franklin e a dinamite de Alfred Nobel. Fui a muitas palestras ouvir sobre estes grandes inventores. Numa destas palestras acabei por conhecer o Dr. Elliot Sputnik. Elliot era um inventor fora de série, tranquilo e cabeça fresca. Sempre estava interessado em sentar e conversar com alguém.
Comecei a me familiarizar com Sputnik, descobri que gostávamos de rir e conversar sobre as mesmas coisas. Ele dizia que as invenções que criava vinham principalmente desses bate-papos com as pessoas. Eu ia regularmente à sua casa, onde ele me mostrava suas invenções e protótipos, algumas vezes bem sucedidos. Elliot também tinha um cachorro muito engraçado chamado Copérnico.
Um dia, eu estava em casa, entediado. Liguei para Elliot para saber se ele tinha alguma novidade. Ele me respondeu que tinha um elemento com o qual não estava acostumado a trabalhar e que gostaria que eu fosse até lá para ajudá-lo.
Cheguei rápido à sua casa. Logo ele me mostrou o que era que tinha mencionado ao telefone. Era uma rara poção indiana, transparente como água, e que era conhecida por ser dito que quem tomasse a poção poderia trocar de corpo com o ser vivo que a tomasse no mesmo instante. Fazia um dia muito quente, avisei Sputnik que iria pegar um copo de água na geladeira. Fui à cozinha. Voltei à sala com o copo de água e deixei-o sobre a mesa, ao lado da tal poção. Neste momento, o doutor começou a me explicar um pouco sobre uma máquina do tempo que havia construído no último final de semana. Depois da explicação, fiquei com mais sede e voltei à mesa onde havia deixado meu copo de água. Olhando para meu amigo, peguei o copo e virei até matar bem a minha sede. Estava tão interessado na história que nem notei quando um pouco da água escorreu, caindo pelo chão. O Copérnico devia estar com sede também, porque lambeu tudo, deixando o piso sequinho.
De repente, comecei a ter a estranha sensação de que eu era mais baixo que a cadeira de balanço de Elliot. Logo percebi que eu não conseguia responder ao meu amigo. Eu lati! Por Deus, eu estava latindo! Eu não tinha tomado água e sim aquela poção que Copérnico lambeu! Eu estava no corpo de um cachorro! Eu não sabia o que fazer! O que fazer para voltar ao normal?!
Girei a cabeça e vi a máquina do tempo. No mesmo instante pensei em voltar alguns minutos no tempo e assim evitar aquele terrível engano. Entrei na máquina e ajustei os controles para dez minutos antes. Pensei que esta seria a minha salvação.
Não sei o que saíra errado, mas eu voltara para o ano de 1958 e estava no meio de Seattle, em Washington. Ali perto havia um rapaz de mais ou menos dezesseis anos, sentado na calçada. Ao seu lado um violão. Ele estava com o rosto cansado e com alguns documentos no chão. Cheguei perto do violão e me deu uma vontade louca de tocar o instrumento. Como? Só havia um jeito: comecei a tocá-lo com os dentes. O rapaz parecia não ter entendido. Pelo menos não deve ter gostado, porque arrancou o violão de mim e saiu dizendo umas coisas que eu não compreendi. Fiquei olhando de longe. Ele parou. Olhou para trás e me fitou por uns instantes. Depois, pegou um lenço do bolso e passou pelas cordas, talvez para enxugá-las, afinal, um cachorro havia babado ali. Então, sem mais demora, ele passou os dentes pelas cordas e notou que saía um som. Repetiu e foi melhorando. Não demorou para atrair uma porção de gente a vê-lo fazer aquilo: ele tocava com os dentes perfeitamente.
Bem, aquela imagem foi se apagando, todos se transformaram em vultos até que por um breve movimento eu retornava à sala do Dr. Sputnik. Consegui tomar de novo a poção e fiz com que Copérnico também contribuísse com a sua parte. Retornei ao meu corpo e voltei para casa para escrever esta história magnífica que me acontecera.
Notaram? De fato eu participei da história da música, pois não revelei ainda a vocês o nome que estava nos documentos daquele jovem: Johnny Allen Hendrix, também conhecido por Jimi Hendrix! Pai da guitarra e dos acordes, da melodia e da harmonia, dos riffs e solos! E imaginar que um cachorro pode inspirar a música, hein! Agora vou embora. Conhecer mais cientistas para ver se consigo fazer outras histórias! Porque, afinal, nada é por acaso. Tchau!
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quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Um Conto de Fogueira


Mário tinha acabado sua história, e agora era a minha vez. Vou contar a verdade, a história que Mário contou foi realmente assustadora. Alguns até tiveram “pequenos acidentes nos países baixos”! O cheiro não estava agradável mesmo!
Mas, que história eu iria contar? Já tinham contado a do “homem do saco”, a clássica sobre o “bicho papão” e muitas outras. Então, com dificuldade, lembrei de uma história que um amigo me contara quando eu era apenas um garotinho. Aquela narrativa me aterrorizara por todo aquele mês de setembro. Trata-se de praticamente um mito que dizia que uma garota de cabelos loiros havia morrido em um banheiro de colégio e que agora assombrava os banheiros de todas as escolas. “É esta a história que vou contar”, pensei. Logo, comecei a narrar a história, tranquilamente, pois não sentia mais medo dela.
Certa vez, fui dizendo, numa antiga escola por onde passei, fizemos um campeonato de futebol. Como apenas os alunos da própria escola iriam participar, foram formadas poucas equipes. Num único dia, todo o cronograma do campeonato seria cumprido. Começamos pela manhã e a final ocorrera por volta das vinte horas. Quando o último jogo terminou, todos se cumprimentaram, brincaram, zoaram uns com os outros. Depois despediram-se todos e retornaram às suas casas. Eu havia sido encarregado de guardar o equipamento usado no almoxarifado. Recolhi tudo e fui para lá com o material. Armazenei os apetrechos todos nas prateleiras e armários e saí. No final do corredor ficavam os banheiros masculinos. Entrei para dar a minha última contribuição. Quando estava diante do espelho, ao lavar as mãos, baixei a cabeça para molhar os cabelos. Ao me levantar, olhei para a imagem do espelho e congelei! O que eu via na imagem? Logo atrás de mim, uma menina de uns quinze anos, com sangue escorrendo em volta dos lábios, algodão no nariz. Seu cabelo era todo amarelo e a pele branca como se nunca nela houvesse corrido a vermelhidão do sangue. Dei um grito pavoroso! Baixei a cabeça imediatamente e vi que toda a pia estava banhada de um vermelho que só podia ser o sangue dela. Não tinha coragem de me mover. Não conseguia olhar para o espelho e nem para trás. Não tive dúvidas: era a loira do mito que aterrorizava os alunos de todas as escolas. E agora? Só sei que imediatamente molhei as calças e não era pela água da pia. Tentei me mexer. Nada. Meus pés pesavam duzentos quilos. Uma voz muito leve, mas com o cheiro da morte, soprou no meu pescoço um hálito podre. “Você vai ficar para sempre aqui comigo!”, sentenciou. Não vi mais nada. Horas depois, meus pais e uma funcionária da escola faziam de tudo para me reanimar, até que conseguiram. Eu estava desmaiado e em volta uma poça de sangue. Ninguém entendeu o que havia acontecido naquela noite. Nem eu. Pensei, deve ter sido um pesadelo, devo ter escorregado, batido a cabeça e desmaiado. O sangue, não sei. Talvez arranhado o braço, a perna, mas agora já tinha sido estancado. Fui embora para casa todo atordoado. Meus pais me levaram para a farmácia, o atendente receitou uns remédios para dores e pronto. Chegando em casa, ao ir tomar banho, tirei minha camiseta e o calção. Notei que havia algo no bolso traseiro. Meti a mão e retirei um chumaço de cabelos loiros. O que era aquilo? Não sei ainda! Alguém quer ver? – e enfiei a mão no bolso.
Dito isso, todos que ouviam atentamente, deram um salto para trás. Uns tropeçaram nos outros e parecia queda de dominós pelo chão do acampamento. Eu também caí do banco em que estava, mas foi de tanto rir.
Meus colegas ficaram visivelmente perturbados, alguns tremiam de medo a cada palavra proferida.
Disse a eles que a história era apenas um mito e que não era real. Nada daquilo havia acontecido. Aconselhei-os a entrar na barraca e tentar dormir. Mas, depois desse susto, quem conseguia dormir?! O máximo que conseguiam fazer era dar um cochilo rápido e acordar agitados pelos pesadelos.

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Malório, o cão convencido


                                                     O Cãovencido


“E o esperto cão estava lá, deitado na grama, em paz. Ele chamava-se Malório. Era um Husky Siberiano corajoso e atento, um verdadeiro cão de guarda que não havia comparação. Mas, na hora de tirar sua sesta na relva fresca, tornava-se o cão mais bicho-grilo da rua. Por ser um cão de guarda dos bons, Malório era o cão mais popular do bairro, deixando os outros cães com inveja.
Tinha muitos adversários como o Cochinho, um Bulldog Inglês, o Coni, um Poodle, e um rival que Malório nem considerava como tal, pois que era apenas um cão Basset, o menor cão da rua, chamado Salsinha.
Salsinha tinha ódio de Malório, porque nem sequer era considerado por ele um rival. Salsinha ia acumulando sua raiva a cada dia, a cada hora, a cada minuto, a cada vez que via o insuportável Malório passear. Todo dia, Malório passava pela sua casa e zombava do pequeno cãozinho salsicha. Até que um dia, a paciência de Salsinha esgotou-se. Ele decidiu vingar-se de seu inimigo zombeteiro. Ele ouviu dizer que as famílias do bairro iriam viajar por um final de semana e que os cães iriam cuidar das casas. Logo, Salsinha já tinha seu plano para aquele final de semana que seria lembrado por muito tempo na história daquele lugar.
Quando as famílias partiram de suas casas, Salsinha pegou um banquinho e conseguiu atravessar seu portão, dando um salto que até para ele foi espetacular. Passou de casa em casa dizendo que estava tramando uma zombaria com Malório, e já que todos os cães tinham um pouco de rancor por Malório, foi fácil convencê-los a participar.
O plano de Salsinha seria o de pôr um filé de carne suculento na rua e esperar que Malório viesse. Todos sabiam da armadilha e nenhum deles se atreveria a correr até lá para dar uma ‘cheiradinha’. O bife estaria preso por uma corda amarrada a uma árvore e atrás dela, Cochinho, o mais forte dentre a cachorrada, puxaria o cordão atraindo Malório até uma moita mais próxima. Lá atrás, já estariam outros que ajudariam a prender Malório pelas patas traseiras numa corda previamente colocada sobre um galho alto da árvore e puxariam-no, deixando-o de cabeça para baixo. Assim, Salsinha poderia latir bem alto em seu ouvido e nem conseguiria proteger-se com as suas orelhas enormes caídas em posição contrária.
Por fim, o plano de Salsinha deu muito certo. Todos aproveitaram para latir, ganir e uivar bem alto ao redor de Malório que, preso, nada podia fazer a não ser implorar que terminassem logo com seu sofrimento.
Depois desse acontecimento, Malório não criticava mais o Salsinha e até mesmos os outros cães passaram a respeitar mais aquele pequeno e astuto estrategista. Ficou provado do que Salsinha era capaz. Seu tamanho podia ser reduzido, mas a cabeça e a imaginação não tinham limites.”

Muitas vezes o menor de nossos inimigos é o mais terrível!

terça-feira, 13 de setembro de 2011

O código do tesouro





Após a descoberta daquilo que se parecia com um mapa de tesouro e que indicava como local o velho casarão do fim da rua, Bob nem se deu conta, quando percebeu, já estava correndo ansiosamente para mais aquela aventura. Quando ele estava quase alcançando o casarão misterioso, parou de correr e continuou o trecho andando bem devagar; enquanto isso, ele só pensava que talvez não fosse uma má idéia voltar para a casa da sua avó.
Hesitante, fez uma inspeção na parte externa da casa. Procurava por algum atalho para entrar e explorar a casa. Notou que uma das madeiras da parede não estava presa na estrutura geral da construção. Então, abaixou-se e tentou ver alguma coisa pela fresta que a madeira deixava à vista. Ele não conseguiu enxergar nada de exótico no interior do casarão, apenas móveis normais cobertos por uma camada grossa de poeira. Ansioso, ele olhou ao redor e encontrou uma árvore que alcançava as janelas do segundo andar, subiu por ela até a ponta do galho onde poderia espiar à vontade. De lá, não enxergou nada diferente de apenas mais um casarão abandonado.
Arrojado e seguro de si, desceu da árvore e dirigiu-se até a porta da frente do casarão. Decidido a entrar naquele abrigo abandonado, ele pegou uma madeira caída em frente às escadas principais da varanda, com tamanho e peso suficientes para fazer um bom estrago e, segurando com bastante força, chocou-se direto com a porta, quebrando a fechadura, a maçaneta e boa parte da madeira. Com o abalo, as paredes vibraram e as vidraças das janelas da frente se quebraram por completo.
Apesar de ser corajoso, passava pelo seu corpo um certo medo de acabar encontrando algo ou alguém ali. Bob entrou lentamente na casa, suas pernas estavam bambeando, mas a cabeça determinada a prosseguir. Assim que ele chega ao meio da sala de estar, ele olha em volta e percebe que a porta e os demais vidros que haviam sido quebrados com o impacto da madeira na porta, agora estavam perfeitos, como se nada tivesse acontecido. Nesse momento, Bob fica apavorado! Desistiu de continuar e tentou fugir, mas os vidros e a porta dessa vez eram inquebráveis.
O pavor já tomando conta de sua mente, ele parou por um instante para organizar as idéias. Lembrou-se daquela madeira quebrada da parede que ele avistara lá fora. Foi procurá-la. Bob não conseguiu encontrar a falha que tinha encontrado no exterior da casa. Apavorou-se mais ainda. Subiu ao segundo andar do casarão e viu apenas um gaveteiro no enorme cômodo que ocupava todo o piso superior. Curioso, abriu o móvel e foi surpreendido por imagens e sons horrorosos! Saiu correndo e pisou em uma parte do assoalho que estava frágil e acabou quebrando de vez, enroscou o pé que caiu no buraco. Aterrorizado, percebeu que aquele sobrado era mal-assombrado.
Depois de finalmente conseguir se livrar da armadilha acidental, pegou o mapa e começou a procurar o tesouro que talvez alguém escondera naquele casarão. Bob analisou cada objeto da casa detidamente, ele não queria perder nenhum detalhe. Por fim ele encontrou alguns livros embaixo de uma escrivaninha, mas estranhamente pareciam ser todos iguais. Por que alguém manteria uma coleção de livros iguais? Bob foi abrindo todos eles. Notou que apesar de serem iguais por fora, o seu conteúdo era formado por letras diferentes, havia códigos e também muitas imagens de baús com tesouros. Bob ficou alegre de ter achado mais uma pista para o tesouro e começou a saltitar de excitação. Porém, ele não percebeu que, ao dar seus saltos efusivos, ele havia rasgado a parte mais importante de seu mapa: a parte que continha uma legenda de códigos.
Ele pegou alguns livros e os colocou sob seu braço esquerdo e junto pôs o seu mapa. Checava-os quando não tinha certeza plena dos caminhos a tomar. Mas, ainda não sabia nada sobre o significado dos códigos. Bob já tinha explorado todo o térreo da casa e não pretendia continuar pelo andar de cima. A experiência anterior no segundo andar não lhe animava a subir as escadas outra vez. Tinha tanto medo daquele pavimento superior que sequer olhava para cima.
Bob ficou por alguns dias preso ali, rondando de um lado para o outro. Não encontrou o tesouro, não encontrou nada. Muito fraco, debilitado pela inanição, ele deixou-se cair bem no meio da sala principal. Alguns moradores do bairro já procuravam por ele pelos arredores. Até que alguém teve a ideia de verificar no casarão. Olharam pela janela e lá viram ele. Batiam nas janelas, nos vidros, nas paredes. Ele, que estivera desmaiado, acordou e viu seus conhecidos vizinhos tentando reanimá-lo pelo lado externo. Foi então que ele estendeu seu corpo pelo chão, ficou de costas e olhou para cima pela primeira vez depois do susto com o segundo andar. Então, ele viu a parte do mapa que perdera e que agora estava presa no teto, pela fenda rachada no assoalho superior.
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quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Fiat Lux


                              A Criação da Luz


As trevas tomavam conta de toda aquela galáxia. Somente lá existia a escuridão, que era sustentada pelo deus Cítaro. Cítaro ia pescar todos os dias, em certo horário.
Um dia, um dos cidadãos dessa galáxia, que estava com ódio de Cítaro por não trazer fertilidade ao solo, encontrou-o em um rio onde costumava pescar. Cítaro, sem perceber que o homem estava ali, levou uma forte pancada na cabeça, com um pedaço de pau. Naquele momento, o mundo desequilibrou-se: a temperatura estava aumentando em lugares que nunca chegaram a níveis tão altos e os rios enchendo com o excesso de chuvas. Cítaro foi para um hospital e ficou lá durante muito tempo, enquanto a galáxia estava puro caos.
Até que um dia, ele mandou uma carta a seu irmão, Íllion, que era o deus governante da galáxia da Luz. A carta dizia que Cítaro estava muito doente e que precisava de alguém para substituí-lo em sua galáxia. Íllion aceitou a proposta e começou a governar a nova galáxia já no dia seguinte.
Íllion começou bem no novo cargo, pois o povo gostava dos raios flamejantes de sol que ele lançava sobre a galáxia. Todos aproveitavam a luz para a agricultura principalmente, já que sabiam que os raios de Íllion não iriam durar para sempre.
Tempos depois, Cítaro recuperou-se, não por completo, mas o suficiente para voltar a comandar a sua galáxia. Mas Íllion, que foi uma solução para seu antigo problema, passou a ser o seu verdadeiro dilema. O povo gostava mais de Íllion, que lhes proporcionava fertilidade ao solo e luz, do que Cítaro, que apenas lhes dava o frio e a escuridão da noite.
Então, Cítaro e Íllion começaram uma grande guerra que durou milhares de anos, pois os dois queriam governar a mesma galáxia. Até que um dia, Cítaro e Íllion, já completamente exaustos, não tendo mais de onde tirar forças para continuar na batalha, totalmente enfraquecidos, estabeleceram que o melhor a fazer seria dar ao povo o que eles gostavam, sem abrir mão do poder antigo do próprio Cítaro. Definiram que um governaria a seu modo uma metade do dia e outro comandaria a outra metade, surgindo assim a divisão do tempo diário em noite e claridade.
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segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Um Baú de Monstruosidades






Lucas e Fernanda tinham acabado de entrar na casa dos avós, como já conheciam o local, se instalaram facilmente. Dona Rosa serviu a eles uma pequena e fervente tigela de mingau. Depois de terminarem a refeição, conversaram um pouco com Dona Rosa, que estava animada por rever seus netos. Depois da conversa, Dona Rosa foi para cama, onde o avô Alberto já dormia. Os jovens sentaram-se no sofá e assistiram um pouco de televisão. Mais tarde, foram dormir.
No dia seguinte, os visitantes, sonolentos, desceram as escadas em direção a cozinha, onde estava dona Rosa, esperando por eles com o café já na mesa. Comeram tudo rapidamente, estavam com muita fome. Entediados, resolveram brincar de esconde-esconde. Mantiveram-se ocupados pelo dia todo, até a chegada do crepúsculo vespertino. Lucas quis se esconder no sótão na próxima rodada. Então, quando Fernanda começou a contar, Lucas subiu as escadas apressadamente.
Chegando lá em cima, escondeu-se atrás de uma poltrona. Pensou em se esconder dentro de um baú, que tinha do outro lado da sala, para maior dificuldade de Fernanda. Então, rastejou-se pelo chão para chegar ao baú sem fazer barulho. Chegou até ele. Abriu-o e, para sua surpresa, não havia objetos lá, mas sim monstros!
Aterrorizado com a imagem, fechou o baú e saiu correndo sem olhar para trás. Quando viu Fernanda procurando-o pela sala, disse:
- Fernanda! Precisamos fazer alguma coisa com um baú que há no sótão! Está cheinho de monstros!
- Ah! Sabia que o coelhinho da páscoa veio me visitar no tempo em que esteve longe de mim? – ironizou Fernanda, rindo após a frase.
Então, Lucas a desafiou para abrir o baú e comprovar se sua palavra estava mesmo certa. A jovem aceitou facilmente o desafio. Foi ao sótão e abriu o baú, sem medo. Aterrorizada como Lucas, fechou aquele depósito de monstruosidades e saiu correndo até a sala, onde Lucas a esperava apavorada e tremendo até não mais poder.
- Desculpe-me! Você tinha razão, mas o que vamos fazer agora?!
- Eu não sei, mas vou pensar em algo.
Fernanda e Lucas vão se deitar, mas dormir eles não conseguem. No outro dia, Lucas se levanta com uma ideia para acabar com aquele problema: decide ir ao sótão com a irmã, pegar o baú e jogar no pântano. Mas, eles encontram um problema: o baú estava preso ao chão, era um elemento da casa, e, se eles o retirassem, não sabiam que consequências receberiam. Mais um dia se passou e Fernanda decidiu pegar armas, como facas e outros utensílios da cozinha, para enfrentar os monstros do baú. Lucas concordou com a ideia, então, logo se equiparam e foram à “batalha”. Lucas entrou primeiro e aproximou-se do baú, junto de Fernanda. Abriram o baú e atiraram facas, utensílios de madeira e muito mais objetos. Mas, depois de acabarem objetos para atacar, descobriram que aquilo era apenas um projetor barato! Descobriram que um botão estava emperrado, então fazia muitos vídeos e sons! Foram à cozinha e sentaram-se à mesa, pasmos com a descoberta. Alguns minutos depois, receberam a notícia de que seus pais haviam chegado. Arrumaram suas malas e entraram no carro:
- Gostaram do final de semana? – perguntou-lhes o pai.
- Sim. Claro que sim.
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Curiosidades Mágicas





Depois de conseguir a bolsa secreta do seu ilusionista favorito, Tim retorna a casa e se tranca em seu quarto, eufórico, pois sua imaginação viajava longe com os segredos que supunha revelar.

Depois de muito vasculhar, encontrou papéis, varinhas, caixas, compartimentos secretos, até mesmo pós e substâncias que iam muito além de mágicas de apresentação. Ele estava diante de um arsenal completo para a realização de magias e feitiços. Um prazer sobrenatural correu por todo o corpo de Tim, colocando nele um sorriso irreconhecível. Vasculhando um pouco mais ele encontrou uma das mágicas que pensava ser capaz apenas em histórias de super-heróis: a capacidade de correr na velocidade da luz.

Os dias foram se passando e Tim se divertia muito com todas aquelas mágicas, sempre as realizando furtivamente para não despertar suspeitas. O que mais o divertia não era a possibilidade de ser reconhecido como mágico, mas ver o efeito das mágicas propriamente.

No dia anterior, havia enfeitiçado um barco que agora voava. Incrível! E naquela manhã mesmo, fez a lua, que ainda se exibia no céu azul, aparecer completamente marrom! Ele tinha descoberto inclusive o poder de modificar elementos da natureza. Tim estava radiante! Mas, como o ser humano nunca fica satisfeito, essas descobertas todas já o estavam entediando.

Ao final do dia, logo depois da escola, Tim se fecha outra vez em seu quarto, pega a bolsa mágica e a vira de cabeça para baixo. Cai tudo em cima da sua cama, não fica nada lá dentro. Entretanto, ele notou que na base inferior da bolsa havia algo compacto, duro, e não era somente um protetor para o fundo. Foi tateando por dentro dela até que encontrou um pequeno fio que ao ser puxado, abria um compartimento secreto que ele ainda não conhecia. Exultou! Abriu-o devagar, de repente, começou a ouvir vozes, primeiro uns gemidos, depois gritos de pavor, horrorosos, quando a aba se abriu completamente, ele viu fogo saindo lá de dentro. Mas não queimava. Era como uma visão.

Tim colocou sua mão dentro do compartimento recém descoberto e retirou um feixe de cartas de baralho em formato triangular. Ele olhou para o pacote e depositou-o sobre uma mesa que havia ao lado da sua cama. Tim novamente voltou-se para ver se achava algo mais lá no compartimento. Não encontrou nada. Quando ele levanta os olhos em direção do baralho, ele fica petrificado. Seus olhos diziam, mas ele não acreditava: a mesa estava flutuando pelo quarto todo.

O jovem aprendiz começou a procurar freneticamente pelos seus livros de magia para tentar entender o fenômeno. Não achou nada que mencionasse o estranho acontecido. Correu para o computador e navegando pela internet encontrou uma página muito soturna sobre bruxaria e ali mesmo, com um pouco de pesquisa, achou tudo que precisava saber para dominar aquela magia. Hesitou por alguns minutos. Pegou novamente o baralho e notou uma combinação de palavras quando ajeitava as cartas como um quebra-cabeça. Pôs-se em posição solene, ergueu os braços, decorou a frase contida no baralho e começou a recitá-la com os olhos fechados. Passado um tempo curto, ele percebe um clarão entrando pela fresta da janela. Aproxima-se e não acredita no que vê: uma luz completamente branca e translúcida toma conta de tudo, como se engolisse tudo que há no mundo. Tudo foi se apagando, desaparecendo, até ficar apenas um cenário desolador completamente neutro. Tudo claríssimo demais, os olhos doíam. Não se avistava a linha do horizonte, o céu e a terra se misturaram, era tudo uma coisa só.

Desesperado, saiu de casa e constatou que apenas a sua casa existia. Seus pais haviam desaparecido, amigos, vizinhos, a escola, as ruas, lojas, parque, praça, árvores, cachorros... Tudo sumiu. Não havia ninguém ou coisa alguma na cidade. Como se nunca tivessem existido. Nem sinal de ruínas. E o ar denso, pesado. Tim pensou: deve ser assim o fim do mundo. Completamente aborrecido, desolado, ele voltou a casa, sentou-se no primeiro degrau que dava para a varanda e ficou ali, meditando e arrependido. A sensação de abandono e vazio ardia dentro dele. Foi assim que passou o resto da sua existência. “Maldita hora em que fui roubar aquela bolsa de feitiços!”, foi a sua última frase.
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quinta-feira, 30 de junho de 2011

Uma Aventura a Maias

Em uma escola da qual não me agrada recordar o nome, por muitos anos, as festas reinavam em pleno verão de dezembro. Era Natal, então, as várias histórias fantásticas surgiam às cabeças das crianças. Mas, a festa sempre tinha de acabar à meia-noite. O espírito de um garoto surgia àquela hora. Assim dizia uma lenda Maia.
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Há poucos lustros desse ano, 1743, meu avô foi a Iucatã, o lendário Império Maia de 1520. Era um amador em história clássica. Porém, seu desejo real era fazer fortuna com algum tesouro histórico que encontrasse. Então, com o pouco dinheiro que ainda lhe restava das economias, conseguiu ir daqui do Brasil para seu promissor futuro sonhado.
Já na cidade mexicana, hospedou-se em um precário hotel, onde guardou suas relíquias, ou seja, um binóculo e uma velha espada do império persa. Lá pernoitou por uma noite apenas, animado com a oportunidade que lhe parecia sorrir. Nessa manhã, ao raiar das seis, pegou seus apetrechos e rumou direto para as montanhas mais elevadas, conforme suas pesquisas anteriores.
Escalou a montanha com enorme dificuldade, sempre checando se havia sinais da época, como os famosos hieróglifos Maias ou desenhos significativos da cultura perdida daquele povo. Já chegando ao cume, segurou em uma pedra para se apoiar como fizera com as outras que encontrara por todo o percurso daquela árdua escalada. Não notou, entretanto, uma pequena lança incrustada em uma elevação que lhe parecia casa de cupins; furou sua mão instantaneamente. Estranhou a princípio: “Como que aquela lança teria ido parar naquele monte tão sólido de terra?” Mesmo sem entender e alentado pelo desejo de alcançar seu objetivo deveria estar tão próximo, renovou suas energias e continuou sem mais demora.
No cume, uma neblina intensa e muito densa tomava conta de todo aquele espaço lá de cima, e no chão, logo em frente de onde ele se achava, curiosamente viu um escudo. O artefato encontrado era de cobre, havia esculpida nele a face de um homem desconhecido, aparentemente era  uma peça forjada pelo antigo povo que habitou aquelas terras há mais de duzentos anos. No verso do escudo, foi encontrado um revestimento que parecia uma argila muito especial nas cores dourado e o azul ultramarino. Ele só não sabia como eles conseguiram o azul, pois a única forma de obter essa cor seria através da pedra “lápis lazúli”, que pesava em torno de uma tonelada e somente seriam encontradas a milhares de quilômetros dali.
Com orgulho e surpresa, abaixou-se para tentar levantar o escudo. Mas, o sangue que lhe escorria da mão cortada fez com que ele retornasse ao mundo real. Ainda sentindo muita dor, arrancou do bolso da calça um lenço que sempre levava e amarrou-o na mão ferida para estancar o fluxo. Elevou o escudo para cima da cabeça e o contemplou contra a luz do Sol. Era magnífico, pensou. De posse dessa relíquia e não vendo motivo para continuar naquele deserto inóspito, retornou ao hotel e preparou seu regresso. Alguns dias depois, estava de volta a São Paulo. Trazia o corpo cansado, mas, no rosto, o sabor da vitória dava-lhe uma cor especial por aquele tesouro arqueológico encontrado; guardou-o no armário com muito cuidado, após envolvê-lo numa toalha de flanela. Pegou um jornal recente que encontrara sobre a mesa, deitou-se na cama e começou a ler sobre uma matéria especial que mencionava o transporte da pedra lápis lazúli, de Lima, Peru, a Iucatã, México. A notícia, contudo, que o chocou foi de que a pedra fora transportada de modo inexplicável: rajadas de ventos! Meu avô desmaiou com a notícia e foi para o hospital. Toda a família estava lá, rezando pelo seu bem. Nos últimos minutos de vida, ainda conseguiu me dizer: “O escudo... Atrás...”. Suspirou pela última vez e vi seus braços penderem para os lados. Meu avô já não fazia mais parte desse mundo.
Dias depois do enterro, ainda inconformados com a triste perda, os familiares decidiram que era hora de distribuir o legado de meu avô. Lembrei-me do seu último aviso: o escudo. Procurei-o. Encontrei-o dentro do velho armário de seu antigo quarto de dormir. Já mordido pela curiosidade, imediatamente fiz uma análise do objeto e vi, atrás dele, hieróglifos Maias e pesquisei os significados. A frase dizia: “Quem ler isso ‘o escolhido’ será. Não poderá fugir ao destino: só você pode curar-nos”.
Tudo isso me deixou muito confuso e comecei a pesquisar muito e li tudo que encontrei sobre os maias por mais de dez anos de trabalho. Um dia, determinado a desvendar aquele mistério herdado de meu avô, decidi ir a Iucatã. A cidade estava deserta, pois, eventos estranhos aconteceram anos antes. Uma epidemia causada por algum vírus que nunca fora identificado, exterminou sua população. Boatos nomearam o caso como sendo a “Síndrome de Lazúli”, em referência às “pedras lazúli” que misteriosamente começaram a surgir por ali.
Já a caminho das trilhas perdidas que talvez meu avô tivesse percorrido, vi uma alta montanha e vestígios de sangue por toda parte. Chegando ao cume, no chão encontrei hieróglifos e conforme minhas pesquisas, pude interpretar como sendo o seguinte: “Honre o povo. No décimo segundo mês do ano em que a soma do par alcançar o quíntuplo do derradeiro, à meia-noite o destino se cumprirá”.
Não havia mais o que procurar por ali. Era tudo ruínas. Saí do país logo, porque diziam não poder ficar por muito tempo exposto ao ar daquela região.
Divulguei as minhas poucas descobertas à minha família. Ninguém me deu a atenção devida e acrescentaram que a herança do meu avô eram suas loucuras que agora estavam me contaminando. Indignado pelo descrédito, provei a teoria iniciada pelo meu ancestral.
No verão de 1743, as crianças queriam festejar com seus pais e até preparavam uma peça para ser exibida na escola. Com os estudos de magias Maias, tentei usar a situação como experiência. À meia-noite, a lua desapareceu como uma luz que apagava, não era um eclipse, pois o “apagão” fora instantâneo. No 26 de dezembro, o subseqüente dia ao Natal, a imensa circunferência amarela e quente não despontou no horizonte.
Permaneci no subsolo do teatro onde a peça acontecera. Estava provada a profecia cujas pesquisas foram iniciadas pelo meu avô, mas que eu concluíra de fato.
Esta história foi narrada por muito tempo ainda. Em minhas previsões, um tal de Leroux ou du Maurier estarão envolvidos. É o que veremos...

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Pregando uma Peça

Para a peça teatral de final de ano naquela escola coisas estranhas estavam acontecendo.



 

Depois da queda de um dos holofotes no ensaio, Carlos ficou muito nervoso. Não sabia o que fazer... Apenas investigar.
Começou interrogando os suspeitos, ou seja, o elenco e alguns alunos de sua sala. Mas, não conseguiu nada que pudesse aprofundar nas histórias levantadas por seus companheiros. Então, passou a dividir em categorias: primeiro, em sua opinião não seriam fantasmas, pois, não acreditava em tal assunto; segundo, por que alguém iria querer arruinar a peça e terceiro, haveria alguém que quisesse Miguel fora do elenco para ocupar seu lugar?
No começo foi difícil pensar em alguém que não gostasse de Miguel, porque ele era, como diziam, “gente boa”. Mas, depois, Carlos começou a lembrar: será que poderia ser o Murilo, o garoto solitário, soturno e o mais reservado da classe, que sempre levava um caderninho no bolso onde fazia anotações, e que sempre tirava a melhor nota em aula de teatro – e curiosamente não fora indicado para aquela encenação?
Carlos contatou o elenco – incluindo Miguel –, ninguém estava para brincadeiras. Todos cogitaram a mesma ideia de Carlos sobre Murilo. O iluminador ficou chocado com o ocorrido no cenário; alguém poderia ter se machucado. Com a pressão do interrogatório, prometeu colaborar no que fosse possível.
Alguns dias depois, Carlos formulou um plano para a equipe:
-Iremos apresentar um ensaio público. Três dias antes avisaremos os alunos de todas as classes sobre a apresentação. E vamos ficar de olho no Murilo para ver se notamos alguma atitude suspeita. – Agiram conforme o planejado.
No dia programado, conforme a observação sobre Murilo durante aqueles dias, concluíram que ele poderia sabotar o cenário, pondo abaixo todas as instalações. Então, fingiram chegar atrasados para poder pegar o ‘sabotador’ “com a boca na botija”, um ditado popular que o Carlos adorava fazer uso.
Infelizmente, não deu tempo para evitar. Murilo já havia preparado tudo e os equipamentos e acessórios do cenário estavam mal instalados – já por sabotagem dele – e vieram ao solo. Não ficou uma só parede de madeira em pé. O palpite deles estava certo: por trás de todas as atitudes suspeitas que ocorreram aquela noite, lá estava a figura de Murilo sorrindo maquiavelicamente. Todo o elenco abordou-o de surpresa. Carlos imediatamente segurou-o pelos braços e dirigiram-se para a diretoria. Deixaram Murilo a sós com a diretora geral da escola:
-Então, Murilo, por que quis destruir tudo nessa peça?
- Quer saber a verdade?
- Adoraria. Ficção é só para os atores no teatro. – Impaciente, a diretora completou: Comece a dizer logo, vamos!
- A razão deste ato totalmente insano e desrespeitoso é que estudo nessa escola há três anos e sempre obtive as melhores notas nas aulas de teatro. Quando soube da peça deste ano, fiquei feliz por saber que as falas seriam em versos. Não sei se a senhora sabe, e não tem por que saberia, mas venho treinando isso desde muito tempo. Pensei que seria minha chance para demonstrar todo o meu empenho. Qual não foi a minha surpresa ao ser informado de que o personagem principal seria alguém que não passa de um bajulador em sala de aula; nunca conseguiu mais do que um medíocre seis nas médias em interpretação. Em minha opinião, esse desqualificado não conseguiria nunca dar o máximo que o personagem exigia; jamais seria tão bom quanto eu, que faço aulas de teatro, dança, música e versos há muitos anos. Está respondida sua pergunta?
- Vendo por esse lado, você até que tem os seus motivos. Mas, convenhamos, não precisava destruir todo o material utilizado na peça, não é mesmo? Por ora, você está liberado. Ainda iremos ver o que faremos com você.
Murilo saiu da sala com sensação vitoriosa pelo discurso que fez; mas, no fundo, ainda sentia muita culpa. Seu amor pelas artes cênicas o condenava por aquela atitude vândala quanto ao material tão bem organizado.
No próximo dia, desculpou-se com o elenco, que declararam entender seus motivos. Ajudou todos na reconstrução da peça. Carlos acabou por incluí-lo, criando um personagem de destaque para o talento de Murilo.


Na apresentação real, todos aplaudiram em pé a bela peça encenada pelos alunos da escola.
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segunda-feira, 16 de maio de 2011

Uma Aventura Dolorida




Quando eu já havia subido um bom pedaço de terra, tentei jogar-me contra o galho preso à fruta. Com muito cuidado, consegui pôr minhas mãos nela. Com uma sensação vitoriosa, ouvi:

- João! Donde é qui ocê tá? O armoço tá na mesa! – Sabia muito bem que, como morava longe da cidade, justamente em zona rural, com aquele dialeto caipira, quem estava me chamando era, nada mais nada menos, que minha mãe, que sempre aparecia na hora errada.
Quando chego perto de algo que luto tanto para conseguir, lá vem ela para interromper o gostinho da minha vitória, sempre estragando tudo. (Pode apostar que eu sou bem azarado!) E por azar total, a fruta se soltou da minha mão e fiquei vendo ela sozinha de novo, lá em cima...
Igual à semana passada. Um amigo meu chamado Chico, que é meu vizinho, propôs-me um desafio: pôr as minhas quinze galinhas para dentro do galinheiro ao meio-dia. E as galinhas, nervosas com a minha intromissão, desceram-me a bicada! Fugi daquela batalha feito burro quando se perde no mato!
Tentando descer daquela montanha da fruta especial, escorreguei e meti o traseiro no chão! Fui deslizando pela encosta toda, ralando as partes glúteas. Quando alcancei o fim daquele caminho de pedras, uma farpa aloja-se em minha mão e um prego no meu pé. Perfeito! Aproximando-me de minha mãe, ela me vendo naquele estado de dar dó, perguntou-me:
- João, ocê tá machucado? – Respondi – Claro que não! Parece que eu estou bem?! Acho que nem dá para notar, né? Traz um burrico para eu voltar para casa! – Ela me traz o Godofredo; o pangaré mais lento de toda região!
Voltando para casa, fui logo ao tanque de lavar roupas para limpar os machucados e o sangue coagulado da pele. Nesse exato instante, meu pai chegou falando para arrebentar! Ele trouxe da cidade um tal dispositivo que  detectava bactérias nocivas pelo corpo. Como sempre impaciente, nem quis falar com um médico; já trouxe de vez uma amostra para testar. E, como não podia ser diferente, fez-me cobaia do tal aparelhinho. Claro que depois dos resultados, ele ficou bravo comigo! O exame “altamente especializado” dele diagnosticou setenta por cento de bactérias em meu corpo. Já praguejou quarenta minutos, que me renderam ainda umas palmadas e um belo “puxão de orelhas”. Como se a culpa fosse minha em ter que viver na roça. Mas, até que eu gosto de lá. Na hora de dormir, ele me trouxe ainda um composto de ervas do tempo da minha bisavó. Preferia ter apanhado um pouco mais! Aquilo embrulhou meu estômago até de manhã! Até o Setembrino, nosso porco, gritava de dor quando meu pai lhe dava aquele “treco”. Dormindo no desconforto da dor e nas mãos do frio, estava pensando naquela fruta que quase conseguira hoje: será que outra pessoa já a capturou? Será que já comeu?! Será que pode ter sido o Chico? Fiquei impaciente. Saí de casa devagar, ainda estava escuro e logo na porta de entrada da cozinha, pisei numa coisa redonda, que me levou de costas para o chão novamente. Hoje é meu dia, mesmo! Ora, era a fruta do galho de hoje cedo. Fiquei pensando: acho que a maneira que me joguei contra o galho foi muito brusca então o galho, fraco que era, deve ter se soltado e a fruta desceu rolando junto comigo, sem que eu visse. De alguma forma, deve ter entrado pela minha calça e nem percebi. Ao chegar em casa, com as dores do corpo todo escoriado pelo “tobogã” improvisado, ela deve ter caído no chão de casa e não notei nada.
- Óia que belezura! Peguei a fruta para dar uma dentada caprichada e, ao tirá-la do chão, observei uma “bela” mordida no meu “troféu”! Levantei os olhos e, então, vi o Novembrino, o porco do Chico deitado do lado de fora, feliz da vida por haver estragado minha aventura.


segunda-feira, 9 de maio de 2011

A Guerra Elementar



Foi aí que o Vento, combinando com os demais súditos do Sol, arquitetou um plano diabólico para destruir para sempre o Astro-Rei. Chamou o Raio e a Chuva e começaram uma guerra sem fim. Era o Sol aparecer que lá vinham eles com seu forte armamento, despejando temporais por toda parte até atingir o próprio Sol.
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Por milênios, era o Sol quem dominava tudo, era o senhor absoluto. O povo e toda a vida na Terra estavam contentes com a sua luz e o seu calor, que ajudava nas plantações de onde tiravam os seus sustentos. É verdade que a Chuva também era necessária; mas, só em pequenas doses, para matar a sede das plantas e encher os rios com água boa.
Certa vez, o Vento percebeu que o povo da Terra fazia muitas oferendas para o Sol, em agradecimento pela fonte de vida que ele lhes proporcionava. Ele saiu voando para contar aos outros amigos o que via com freqüência e também para comentar que nunca tinha visto a mesma homenagem para eles, nunca ninguém havia oferecido algo pela Chuva, Vento ou Raio.
Com inveja nos olhos, eles correram até o Sol e exigiram que também tivessem o mesmo respeito. O Sol, sempre muito justo, sugeriu fazer uma consulta ao povo. Mas, os elementos tinham imposto uma condição: eles queriam aparecer mais, ou seja, chover mais, ventar mais e mais raios de trovão queriam cantar pelo céu da Terra.
O povo não gostou da ideia de sofrer mais tempestades, achava que o que existia já estava bom. Então recusaram a proposta. O Sol informou aos elementos a resposta dada. Porém, eles não gostaram nada. Então, começaram a se rebelar e se uniram para fazer tempestades todos os dias, da primeira hora da manhã até a última da tarde. Só paravam com a noite. Dessa forma, com a ajuda das nuvens de Chuvas, encobriram e esgotaram todas as energias do Sol até que, completamente esgotado, ele tornou-se presa fácil e foi jogado numa masmorra, onde era vigiado vinte e quatro horas por dia, as grades eram feitas das filhas do Raio e do teto gotejavam as primas da Chuva sem parar. Seu fogo já não ardia como antes e restava dele apenas uma bola avermelhada do núcleo.
O povo e todas as espécies viventes na Terra suplicavam para que os elementos deixassem o Sol voltar a brilhar no céu, já estavam ficando sem comida, as plantas morrendo afogadas por tanta água que vinha de cima, as casas eram destruidas pelos Raios, só se ouvia o barulho do trovão por toda parte do mundo.
Com tanta Chuva, as nuvens começaram a ficar sem água. Eles tinham esquecido de que a base de toda a tempestade é a Chuva e ela é que vem acompanhada de Raio e Vento. Se a Chuva acaba, não existem mais os Raios nem os Ventos. Então, pelo mundo, o que se via é que as tempestades foram diminuindo, diminuindo, até ficar apenas uns chuviscos e garoas aqui e ali. Os Raios não tinham mais força para gritar pelo mundo e os Ventos não passavam de pequenas brisas frescas pela manhã.
Diante dessa situação, os elementos perceberam que ficavam cada vez mais fracos e que o fim deles estava próximo. A Chuva não aguentando mais, sem água nem para as lágrimas, lamentou-se profundamente chamando a todos os demais e relatando o caso. Ou a água que havia lançado na Terra tornasse a formar novas nuvens ou iriam todos desaparecer para sempre.
Eles pensaram em fazer algo para atrair a água dos rios, lagos e oceanos de volta para o céu, mas, sem sucesso. Porque seria impossível ao Raio ou ao Vento levar uma quantidade muito grande para as nuvens quase secas. Foi aí que perceberam a grande verdade da vida: o Sol não era apenas o Astro-Rei à toa, era responsável por fazer toda a natureza funcionar corretamente, colocando cada coisa em seu lugar, recebendo água e enviando em forma de Chuva quando necessário.
Depois de muito pensar colocaram em votação e ficou claro, por três votos a zero, de que o Sol precisava retornar urgentemente para garantir a sobrevivência de todos, dos elementos e do povo. Porque sem o povo e de toda a vida na Terra para usufruir dos efeitos dos tempos da natureza e do clima, não haveria necessidade deles e daí é que não serviriam para nada mesmo.
Num ato solene, com muito respeito e consideração, foram os três para as masmorras e ordenaram que o Sol fosse libertado. Os Raios das grades que tomavam conta do lugar desapareceram e a saída ficou livre. O Sol, vendo que todos ali se desculpavam pelo grande erro cometido, perdoou-os todos e voltou a ser o grande Astro-Rei levando vida e alegria a todos os cantos da Terra.
Tudo voltou a ter cor e perfume, as plantas voltaram a crescer e a dar frutos, os homens e os bichos puderam de novo receber da natureza os bons alimentos que sempre os sustentaram. E o povo da Terra percebeu também a importância que há em cada elemento da natureza e como precisam de todos, de forma equilibrada, e passou a homenagear cada elemento num dia diferente pelo ano, criando o dia da Chuva, do Vento e do Raio.
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segunda-feira, 2 de maio de 2011

Ah! Superstições...





Ah! Esse grande mundo... Cheio de superstições para enganar os tolos. Como aquela velha história do gato preto, dizem que na “idade média os gatos eram bruxas transformadas em animais; por isso a tradição diz que cruzar com gato preto é azar na certa”. E tem a lenda da escada, “nunca devemos passar por debaixo de uma escada porque atrai má sorte”.
Outro dia, um amigo meu, o Jerry, contou-me histórias sobre uma certa caverna muito estranha, que ficava lá na praia, depois daquele braço de mar, onde começa a floresta. Mas, será que dava para acreditar em alguém que não era muito conhecido por dizer verdades, tanto que já o tinham apelidado como “Balelão”?  E não tinha um só dia que ele não me contava a mesma “lorota dos fantasmas” da tal caverna. Chamei-o para uma conversa:
- Olha, eu até vou contigo nessa tal caverna que você fala; mas, o que eu ganho se não houver fantasma nenhum lá dentro?
A princípio ele me olhou com ar de desentendido. “Como assim? Ganhar?”. Claro, porque eu não iria me meter lá no escuro da noite sem levar um ‘cobres’ no bolso.
- Tudo bem. – Respondeu depois de um tempo. - Se você ficar lá dentro a noite inteira e não aparecer nenhum espírito fantasiado com lençol eu te pago... Vamos ver... Umas vinte “pratas”. Topas?
- Fechado.
Pensei comigo: “Vai ser moleza! Vinte ‘contos’ no bolso”.
No dia seguinte, já bem cedo, nos encontramos no quiosque da praia. Seu José, o dono do pequeno comércio, nem havia chegado ainda. O “da lorota” veio logo dizendo que a gente precisaria de uma barraca ‘das boas’, porque poderíamos ser atacados por algum bicho feroz na madrugada adentro. Lá fomos nós até uma loja de artigos esportivos para comprar uma. Mas, o menino não era nada bobo, disse que não tinha todo o dinheiro e se a barraca não ficaria por minha conta. Lá se foram preciosos cento e setenta reais.
Naquela tarde mesmo, nós arrumamos tudo e partimos às cinco horas. Minha casa ficava do lado oposto, tínhamos que atravessar toda a praia, passar pelas pedras gigantes do fim da orla, atravessar o pequeno braço de mar que entrava pelo continente; depois, seguir por um caminho entre árvores, já no começo da floresta, um lugar que pouca gente ia. Só mesmo aquele pessoal do turismo ecológico é que costumava passar por ali. Ali tinha uma cerca de arame farpado, que eu nunca soube por que existia, se não fechava nada e nem protegia coisa nenhuma. Descemos por uma trilha escorregadia e cheia de pedras molhadas até que no fim dela avistamos a entrada da caverna.
Confesso que quando a gente falava sobre a caverna, lá na praia ainda, minhas pernas não tremiam tanto. Mas, eu não queria demonstrar medo. Falei com o Balelão. Chamei-o. Perguntei se não iríamos entrar logo. E ele nada. Não dizia palavra nenhuma. Olhei para o rosto dele e estava mais branco do que o uniforme de médico do meu tio. Procurei acalmá-lo. Afinal, não poderia ser tão ruim assim... ou seria? Ai, meu Deus!
Coletamos um material para fazer fogueira dentro da caverna. Ela era muito grande, daria para morar uma família inteira ali e sobrava espaço. Ajeitamos tudo num lugar lá dentro, que julgamos adequado. Fizemos uma fogueira pequena. Com a luz dela, conseguimos montar a barraca. Comemos o lanche que havíamos trazido pronto e fomos direto para dentro da barraca. Jogamos os colchonetes pelo chão e os sacos de dormir por cima deles. Ficamos sentados ali por horas, conversando e tentando espantar o medo.
Lá pelas dez da noite, ouvi um ruído muito estranho, parecia um gemido. Na verdade, eram dois. Dois gemidos! Perguntei para o meu amigo se ele havia escutado também. Ora, ora, um dos gemidos vinha dele. E o outro? O que seria? Fantasmas? A lenda era real? Meu amigo completamente branco de novo. Não falava, não piscava, não mexia um músculo. Tentei movê-lo e então empurrei-o para o lado e o barulho sumiu. Então, ajoelhei sobre onde ele estava sentado para ver se estava tudo bem e percebi que debaixo do colchonete havia alguns pedaços de madeira. Quando eu os pressionava, o barulho surgia. Era só isso! Meu amigo voltou do seu “mundo maluco” e tratamos logo de ir dormir.
As horas passando e nada do sono chegar. Por volta de duas da madrugada outro barulho. Agora era o fantasma! Vinha do lado de fora da barraca. E quem vai lá fora ver? Eu que não! Vimos uma sombra tomar conta de toda a lona da barraca pelo lado de fora. Vinha cobrindo tudo. Agora estamos “fritos”, pensei. Ufa! Passou. Era só uma coruja que ficou entre a barraca e a luz da lua que entrava pela abertura da caverna. Ao se afastar, suas asas pareceram gigantes. Pelo jeito era só medo à toa. Não tinha fantasma, nem nada por ali. Dormimos.
O dia amanheceu e fantasma nenhum apareceu. Acordamos com as costas doendo por uma noite muito mal dormida. Pegamos nossas coisas, desmontamos a barraca e voltamos para casa. O Balelão tinha um sorriso de culpa e envergonhado por desvendar seu conto da “carochinha” e pelo pavor que vivemos naquela noite. De cabeça baixa, entregou-me o dinheiro da aposta. Ganhei vinte “pratas” e gastei cento e setenta. Grande lucro! Enfiei as duas notas de dez no bolso. Partimos. Ah! Superstições...
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terça-feira, 26 de abril de 2011

Um Alfabeto Estranho



Nesse mundo virtual tão novo, moderno, carregado de gírias e linguagens de grupos específicos, a gente já não sabe mais o que é comunicação. Pelo menos, não sabe mais se comunicar como antigamente, quando se escrevia uma carta em bom português. Aquela língua nossa, pátria, o vernáculo (que observa rigorosamente a pureza e correção da linguagem. / Idioma próprio de um país – segundo o Michaelis). Enfim, um sistema de códigos e signos que todo mundo podia entender.
Claro, sempre que se fala de grupos, seja de amigos, escola, do fim de semana, das brincadeiras, das bandas de música, de artistas, enfim, há aquele modo todo próprio de se utilizar a linguagem, com seus jargões, seus clichês, suas peculiaridades. Como por exemplo o ‘jabá’ que para o meio artístico significa um ganho extra para a exibição de algum trabalho;  o ‘desejar bosta’ (ou seu equivalente: ‘merda’) para a trupe de teatro que alega ser assim o modo de se pretender que numa apresentação saia tudo correto (eles acham que se usar termos como “sorte” ou “sucesso” aí é que vai dar bosta mesmo!).
Outro dia, estava eu tentando me comunicar com um amigo via chat, na internet, e não vou mentir, precisei de um tradutor especializado para compreender aonde aquele papo estava querendo chegar. Foi mais ou menos assim: (é fácil saber quando sou eu que escrevo, está em nossa língua pátria mesmo!)

- Olá, tudo bem com você?
E ae brow! Blz! Num tamu junto + tamo nu sangue! :-)
- Como é que é?
OMG! É nóis que voa bruxão! ;))))
- Desculpe, não estou entendendo... como assim?
LOL! Shaushuahuahsuahsuahsuahsua!   =P
- Vixe... assim não vai dar... você quer falar o português direito!?
Kkkkkkkkkkkkkkkkkk tu é muito sacal, véi! Que karai da PORRA é essa?????? Naum tô ligado! Vc tb naum cola.... num dá liga....  |O|

E assim prosseguia. Não preciso falar que depois tivemos que conversar pessoalmente, porque escrevendo não dava pé. Eu só queria perguntar a ele se havia ido à escola no dia anterior, porque tive que ir ao médico e faltara à aula. Precisava saber de alguma lição nova, um trabalho de casa, qualquer coisa assim. Ou não.
Meu amigo fala a minha língua quando conversamos diretamente. Eu não sabia que pela internet suas palavras (eram palavras?), aqueles “sinais” poderiam significar alguma coisa. Para mim não diziam nada. Outro dia eu ouvi alguém comentando sobre ser “analfabeto da informática”. Deve ser isso aí. Por que ou eu não sei mais falar e escrever ou aquele meu interlocutor virtual não era desse planeta ou de nenhum povo conhecido ou idioma catalogado. Se ele usasse uma língua estrangeira eu poderia até traduzir com o Google Translate... Mas, aquilo era sinistro demais.
Sou tradicional, ainda escrevo “você” com as quatro letras e “também” grafado desse jeito aí mesmo, e não um simples “tb” ou “vc”. “Demais” para mim é assim mesmo, e não um “D+”, isso que aí fica é nota de quem não foi bem na prova e quase alcançou a média. E aqueles quatro pontinhos no final? De onde saíram? Reticências usam apenas três deles. E será ainda que eles usam aquele monte de sinais de interrogação para expressar que a dúvida seria muito grande??? (Olha eu aí usando também, para tentar “entrar no contexto”). Gargalhar pela internet agora é “KKKKKKK” e quando querem “tirar onda” usam o “shuashaushaushashau”. Pensando bem, esse chat está ficando muito chato
Não adianta procurar em dicionários... Não tem! Mas, o Google está lá para isso. É só pôr as letras na caixa de texto e alguma explicação vem. Detesto quando tentam explicar usando o mesmo alfabeto e idioma. Aí já é uma “puta falta de sacanagem”. Pois é, outro dia eu estava lendo uns blogs e me vieram com essa: “puta falta de sacanagem”. Meus pais não acreditaram quando vieram me chamar no quarto para jantar e me encontraram completamente imóvel, os olhos esbugalhados, não piscavam. Por um instante pensaram que algo muito impressionante me chamara a atenção no monitor. Não era. Não possuía mais os movimentos, paranóia total. Fui parar no hospital na mesma hora. A noite inteira para me recuperar daquele susto. E tome soro na veia. Faltei mais um dia na escola, claro! Mas, dessa vez, nem pensar em me conectar ao MSN para falar com aquele meu amigo. Ainda me dói o braço das agulhadas da noite anterior.